quinta-feira, 27 de março de 2008

Betting against the American dream nº5

Já cá canta mais uma. Desta vez não foi no sítio do costume. Na quinta-feira passada passei por lá mas o preço da dita ainda não tinha descido: continuava nos 660 Euro. Isto depois da queda do Ouro para 600 Euro em Londres! Como sei que eles deixam sempre uma diferença de 40 Euros de lucro entre o spot price e o que se vê na montra, mandei-os dar uma curva. Ruminando frustações, deambulei pela Baixa até embater num sítio incrivel, uma velha loja de numismática e venda de prata. Como também pretendo investir na Kissing cousine do ouro - nasceu em mim a ideia de ver se tinham American eagles ou Buffalos. Talvez até tivessem o que me tinha levado à Baixa.
O sítio merece descrição: formigando por incontáveis prateleiras de vidro, estantes e recantos viam-se moedas antigas e recentes do planeta inteiro. Havia também fotografias a preto-e-branco com imagens antigas e uma extraordinária colecção de fotos de pretéritas equipas do Sporting (bem como de equipas estrangeiras de futebol).
Dir-se-ia ter aterrado em 1935.
Então, no interior deste depósito de coisas velhas vi o vendedor, o qual, lia entretido o jornal na pose sentada de quem, pareceu-me durante um fugaz segundo, se alivia na sanita de casa.
Afinal era um banquinho minusculo que o apoiava. Levantou-se.
"Boa tarde. Tem Kruggerrands?" disse, procurando dar aos meus lábios o melhor som afrikander que ouvi no ficheiro sonoro da Wikipedia.
"Anh?" disse este abrindo muito os olhos.
Claro. Lá conseguiu perceber depois o que eu desejava. Mas não vendia ouro, só prata. Disse-lhe que apenas estava interessado na prata propriamente dita e não em numismática. Ele sorriu e disse-me ter bullion coins americanas e mexicanas, usou mesmo a expressão em inglês. Afinal era apenas um pouco surdo.
Quando eu me preparava para pedir para ver algumas ele disse-me que podia-me arranjar um Kruggerrand. Contou-me então ter oferecido uma ao filho, há dois ou três anos, mas que ele «não queria saber» e que lhe estava sempre a pedir para a vender».
"Trabalha num banco, sabe".
"Pois." Eu estava ver o filme todo: "o ouro é uma relíquia para velhos tontos e sovinas". "O que está a dar é crédito, crédito, crédito". "Faça um PPR que é ao mesmo tempo um cartão de crédito" (Este produto é fantástico. clicar aqui para ver esta aberração de usura. E feita pelo Banco do Estado. É ignóbil!).
"Vendo-a por 625 Euro". disse de repente.
Fiquei perplexo.
O diabinho Judaico no meu ombro esquerdo berrou-me: «aproveita! aproveita! Ele não sabe a cotação diária do ouro! Ele deve dar crédito ao Manual de numismática dos tótós do Banco de Portugal" (para quem não sabe este manual é para o moderno comercio de metais preciosos o que o Borda d'agua é para a Meteorologia). Aceitei imediatamente.
Vi-o então, ao manual! Era mesmo verdade. Do meio dos seus milhentos papeis lá veio o tal manual de numismática do Banco de Portugal. Quase tive uma erecção.
"Hum! Hum!" grunhiu. "Aqui diz que o Kruggerrand vale 750 Euros na Venda".
"Palhaços" ri para mim próprio. E disse-lhe "Olhe que ali na [sítio do costume] um Kruggerrand são 660 Euro." Especulei depois: "É que esse Manual olha para as moedas de um ponto de vista numismático. Possivelmente esse valor é o da versão "Proof" dos Kruggerrands.
O homem pousou os óculos e olhou-me por instantes.
"Meu caro senhor: eu propus-lhe um preço de venda de 625 Euro e como sou um homem de palavra, mantenho-a. Acabou de fazer um excelente negócio".
Senti-me um porco capitalista. Note-se que nesse preciso momento, em Londres, vendia-se 1 onça de ouro a 603 Euro. Estava possivelmente a comprar ao preço que os grandes retalhistas compram (com efeito, verifiquei depois, a Kitco.com a essa hora: estava a vender a mesma moeda a 620 Euro - fora despesas de envio do correio!). Oinc-Oinc.
"O senhor também fez um bom negócio (o que até é verdade - veja-se a evolução do preço de há dois anos para cá). Acabou de ganhar um cliente. Estou de facto interessado em comprar moedas de prata e já sei onde as virei buscar".
Só havia um senão: como disse, não vendia ouro e a moeda estava no seu cofre pessoal no banco. Tinha de falar com o filho, ir buscá-la e trazê-la para a loja. Isso significava que eu só teria a moeda na 5ª feira - hoje, dia 27. E havia mais: o filho queria dinheiro vivo, não cheques. Ou seja, teria de ir ao meu banco à hora do almoço levantar 625 Euro e ir até á Baixa com essa linda quantia a pesar-me no bolso para, em seguida, dirigir-me ao balcão, na outra ponta da cidade, onde se encontra o meu próprio cofre bancário a fim de a depositar.
É óbvio que esta história do cheque em vez do dinheiro vivo era conversa de treta, mas absolutamente compreensível para um numismático. Aceitei, claro.
E assim, hoje juntei mais uma menina para o meu PPR.

Pormenor divertido: com estas andanças - de taxi, claro - entre os balcões do Banco, a Baixa e o trabalho acabei por perceber, feitas as contas, que a moeda me acabou por ficar por 648 Euro. Se tivesse ido ao sítio do costume e supondo que receberia o meu desconto habitual de 10 Euro teria gasto 650 Euro e tido uma viajem de ida descansada.
Deus não dorme.

1 comentário:

Anónimo disse...

Óinc óinc!
Um dia serás um velho capitalista e saltarão moedas de ouro das tuas orelhas. Só tenho pena de não ter feito mais vezes companhia nesses percursos, quando essas preciosidades tinham preços mais aceitáveis.

Beijos
M.