terça-feira, 22 de abril de 2008

Dia da Terra

É, uma vez mais, "Dia da Terra". E uma vez mais este dia serve apenas para aumentar o rol de notícias deprimentes sobre o estado do Planeta que comemora.
Já nesta cabine foi tratado o problema de icebergs, metafóricos e não metafóricos, cercando o Titanic em que a humanidade se encontra. Não se irá bater na mesma tecla, mas convém referir o acontecimento - quase diria - irónico, sucedido em Nova York também neste dia: o petróleo atingiu um novo máximo histórico, 119 dólares americanos. Ontem, segundo este artigo no Bloomberg, os Estados Unidos acabavam de ser ultrapassados em termos de consumo anual de petróleo pelos "quatro grandes" do mundo em desenvolvimento (China, India, Rússia e Países do Golfo). Segundo dados fornecidos pela IEA (Agência Internacional da Energia), qualquer ganho, quer em termos de eficiência, quer em termos de destruição da procura - leia-se: recessão económica - em relação ao ouro negro, será irrelevante. O número de veículos comprados pelos asiáticos mais do que assegurarão a continuação da alta de preços nos combustíveis, uma vez que, a oferta não irá - porque já não pode - crescer.
É portanto uma via de sentido único. E será curioso também especular o que poderá acontecer quando o preço atingir os 200 dólares ou passar esse valor. Interessante também, será a possibilidade de virmos a assistir a falta física de gasolina nas bombas. O que acontecerá então? Como se irá todos os dias para o IC-19? Será possível ir de Sintra ou Oeiras até Lisboa com o litro de gasolina a 30, 40, ou 50 Euros?
Parece que já estou a ouvir os comentários: "eles" vão inventar um substituto para a gasolina, etc. Lamento informar que isso até pode acontecer, infelizmente terá de se explicar 1) como se irá substituir o parque automóvel doravante obsoleto por outro "eléctrico"; 2) com que dinheiro iremos comprar esses veículos, uma vez que toda a gente está afogada em créditos e dividas e finalmente 3) será que esses novos veículos que "eles" vão construir terão a mesma versatilidade, baixo preço e relação energia/preço dos veículos a gasolina? Obviamente não existem respostas a estas perguntas para além de vagas promessas nas quais "eles" nos asseguram que tudo correrá bem. Por esse razão, afirmo e continuarei sempre a afirmar que as pessoas, no dia em que o Iceberg embater, passarão o primeiro dia a brincar no gelo, como se nada de particularmente grave tivesse ocorrido. E que tem isto a ver com o "Dia da Terra"? Tem tudo. A subida imparável e irremediável do preço dos combustíveis acabará por provocar o fim do automóvel enquanto veículo de massas e o fim de muitas outras coisas que provocam enormes danos no ambiente, tais como: industria quimica, agricultura industrial, "Maçãs vindas da África do Sul", "roupa vinda da China", adubos e plásticos.
Porém, tal como no mito grego de Pandora, em que as fúrias e males do mundo são libertados pelo abrir da caixa; também nós encontraremos a esperança na forma de um planeta finalmente livre da pressão da sociedade de consumo.
E Isso é bom? É. Ir-se-ão os aneis mas ficarão os dedos, querem melhor?
E Isso vai custar? Vai. E de que maneira. Corremos o risco até de perder a democracia (quantas sociedades não-urbanas e, ao mesmo tempo, democráticas é que existiram ao longo da história? Eu digo-vos: zero).
A passagem voluntária, ou sem terriveis custos humanos, para um mundo livre da sociedade de consumo em que vivemos, só é possível na cabeça de hippies velhos e outros místicos ocidentais.
Só espero que os proverbiais Hitleres e Estalines não aproveitem para entrar em cena enquanto for energeticamente possível fazer deflagrar a IIIª guerra mundial.
Até lá:
Feliz dia da Terra! Que o possamos celebrar, um dia, com genuino orgulho e satisfação!

domingo, 20 de abril de 2008

Fui promovido! Hurrah!

Finalmente chegou a tão aguardada promoção no meu ganha-pão! Aproveitando a revolução existente as chefias repararam em mim e promoveram-me.
Passo a mostrar uma transcrição do mail:
Caro camarada administativo Zoompt Rasputine:
O Soviet Supremo decidiu convidá-lo a ingressar num dos nossos departamentos centrais, em Moscovo. É tempo de organizarmos o departamento de
[...]. Os anteriores responsáveis, criminosos lacaios da burguesia - descobrimos - encontravam-se ao serviço da Contra-revolução. Os seus actos sabotadores e as suas criminosas omissões deixaram largos milhares de documentos sem organização no Cronicário do citado Departamento. Como sabemos que é operário-especialista na organização de Cronicários pensamos em si para a tarefa. Estamos a par do seu amor pelo partido e da sua exemplar folha de serviço. Sabemos que já desempenhou tarefas destas em tempos passados. Confiamos em si e portanto a nossa colectiva pessoa decidiu retirá-lo da Sibéria onde agora trabalha e chamá-lo ao seu generoso seio.
Esperei quatro anos por este momento. Curiosamente, há quatro anos atrás, precisamente neste mês de Maio, entrava para o meu actual ganha-pão, abandonado um mal pago e incerto emprego num Cronicário. Agora volto a trabalhar com Cronicários, como se um círculo se fechasse na minha vida.
Só espero que tudo corra bem. Esta é uma daquelas oportunidades que aparecem de vez em quando na vida e constituem pontos de viragem. Também espero que a Revolução em curso não me arraste no seu turbilhão. Recebi já, por portas e travessas, informações fidedignas sobre gente caída em desgraça e conspirações sussurradas na Capital, para onde agora vou.
Mas talvez seja bom encarar esses factos como ossos do ofício. Afinal, é nas capitais que as coisas interessantes acontecem e onde a acção está. E onde eu agora também estarei...

sábado, 19 de abril de 2008

Ilusões macabras

O título deste post, plageado do título de um livro de Cunha Leal, publicado em 1964 e relativo às intenções do Governo de então em relação ao ex-Ultramar, serve como uma luva para descrever a presente atitude dos governos mundiais - e respectivas sociedades - em relação áquilo a que chamo (à falta de melhor) "O que aí vem".
"O que aí vem" é, sucintamente, o colapso daquilo a que nos temos habituado a encarar como (igualmente à falta de melhor) o "mundo moderno". Não sei se o colapso virá daqui a um ano ou dez. Nem sei se a sua fase aguda terá um impacto imediato ou se se arrastará por um tempo mais ou menos longo. Aliás, como aconteceu com o Império Romano do Ocidente, as luzes podem até extinguir-se de todo, só voltando a reacender-se no milénio seguinde e aos poucos. Calculo, porém, que a vida fácil da 2ª metade do século XX e início do XXI - sim; apesar de tudo - acabou e não voltará mais.
Os sinais estão aí para quem os quer ver. Ao longe, no telejornal nacional chegam ecos distorcidos de problemas "lá fora"; há o Bin Laden e o seu franchising de patifarias; um desassossego geral no terceiro mundo e dificuldades no dia-a-dia. "A vida está cada vez mais cara" oiço dizer em conversas com colegas meus do ganha-pão e em mails de amigos em terras exóticas. Nas televisões estrangeiras os problemas estão mais visíveis e são dissecados com maior profundidade, é verdade; e existem websites (alguns com links na cabine) que mostram a nudez assustadora da crise que aí vem. De um modo geral, todavia, muita gente continua a confundir causa com consequência, o que é muito mau tendo em conta que tempos de turbulência requerem análises certeiras.
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O nome deste blog não foi escolhido por acaso, como julgo que acontece com a maioria dos seres da blogosfera. De facto, acho que a actual sociedade é bastante parecida com o Titanic na sua uníca viagem: um milagre técnico, com condições de vida a bordo nunca antes atingidas - mesmo na 3ª classe - e universalmente considerado invulnerável. Assim vai este mundo. A crise ambiental? Todos a lamentam como antigamente se lamentava a existência de povos pagãos: "há-de se resolver isso com penitências e missionários". A crise política? "dêem-lhes tolerância, que as diferenças diluêm-se". A crise financeira? "baixem os juros (ou seja, imprimam dinheiro) para as pessoas continuarem a comprar coisas (ou seja, endividando-se mais e mais)".
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Há-de de chegar o Iceberg. E quando chegar as pessoas hão-de passar o primeiro dia a brincar no gelo tombado sobre o convés. Creio nisto como muitas pessoas crêem, por exemplo, na 2ª vinda de Cristo.
Esse Iceberg tem um nome: pico petrolífero. Em torno deste Titanic planetário, enormes blocos enchem as águas ainda há pouco tempo limpas. Já estamos, portanto, perto da área de embate: a gasolina não pára de subir nas bombas. E, por arrasto, tudo aquilo que directa ou indirectamente depende do petróleo, desde o pão e bilhetes de autocarro a aspirinas e água potável, sobe. Curiosamente certos itens vêm o seu valor cair: casas à venda e o dinheiro que temos na carteira não param de perder valor.
A reacção das pessoas que vejo todos os dias relativamente a esta subida é um bom exemplo da cegueira reinante, como disse. Não é que eu julgue saber mais do que quem quer que seja; afinal a informação está disponível para todos. O que me custa é aperceber-me que muita gente está a confundir causa e efeito; na altura do embate propriamente dito pode fazer toda a diferença discernir a fonte do problema de modo a conseguir colocar o maior número de pessoas possíveis nos botes salva-vidas. Disso, depende afinal a viabilidade para continuar a ser possível um modo de vida civilizado (o que não inclui apenas ausência de selvajaria, mas também hospitais, eleições e Estdo de direito).

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Ontem ou anteontem estava a caminho do ganha-pão e ouvi na Rádio um ouvinte comentar dever-se a subida do custo de vida "às especulações dos fundos [de investimento]". Sem dúvida que a fuga de capitais para as matérias-primas, provocada pelos primeiros icebergs (a queda do mercado imobiliário) provocou a subida do preço dos produtos finais. Afinal, a maneira mais fácil de escapar a uma bolha especulativa é criar outra bolha especulativa onde o capital se possa refugiar (à maneira das pragas de gafanhotos). Infelizmente, para o ouvinte esta era a única fonte da subida dos preços. Não foi a primeira vez que ouvi esta ideia. Também nos jornais e nos taxistas, começa a tornar-se sabedoria convencional a ideia de que "os especuladores e os bancos" (odiados por causa do preço das prestações das casas) estão por detrás da carestia de vida.
As pessoas (isto é, a classe média) parecem esquecer-se - ou ignorar - que os fundos de pensões, aplicações de poupança e os empréstimos das casas floresceram durante os anos 90 precisamente a seu pedido. Quem aluga casa? "Isso é para os pobres"; Quem pediu aos governos descontos fiscais a troco de PPR's? "Os que neles votaram". Quem foi de avião para as Seychelles montado num cartão de crédito? "Muito boa gente que, a pronto, nem dinheiro tinha para umas férias no Algarve".
Obviamente que os bancos e demais instituições financeiras têm de aplicar capital em algum sítio para financiarem toda a dependência consumista do cidadão comum. Até Agosto de 2007 foi o imobiliário; agora "futuros" de petróleo, gás natural, trigo e ouro. E como precisam de ganhar dinheiro tendem a vender mais caro o que compraram barato.

Mas a fonte do problema é outra. Paralelamente a este ruído de fundo quase não passa uma semana em que não é descoberta "mais uma jazida petrolífera". Até ao largo de Peniche já se fazem sondagens! Estas notícias são o som das petrolíferas a "rasparem o fundo do tacho planetário". No mundo actual as grandes jazidas de sweet crude em terra firme estão esgotadas. E não há outras. Há apenas petróleo em sítios ou de dificil acesso (em alto mar e nos Polos), ou de fraca qualidade (demasiado enxofre, demasiada água, demasiado cascalho) ou as duas coisas. Consequentemente, o preço não pode baixar, ainda que os fundos de investimento não comprem uma gota de crude. É uma razão geológica que impede que os preços desçam através do aumento da oferta, à qual, se junta uma razão financeira que impede por sua vez que a procura diminua por muito má que a economia esteja. Estamos pois entalados entre o fogo e a frigideira.
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Chegámos à questão. Nos últimos, digamos, trinta anos, tomou-se consciência de que os recursos ambientais se estão a esgotar. Esta tomada de consciência é patente na ascenção da ideologia ambientalista, a qual, substituiu a crença no amanhã socialista na cabeça de muita gente. Mas até aqui, quando extremista, era apenas uma forma de demonstrar superioridade moral à falta de um Deus cristão. Agora, porém, sente-se na carteira e na constante diminuição da terra arável, a crise profunda em que o meio ambiente caiu. Motivo: se até aqui o Ocidente explorava quase sozinho os recursos do planeta, agora (a partir dos anos 90) largas porções de humanidade como a China, a India, a América Latina, e até alguma parte da África começam a vislumbrar ser possível atingir o nosso nivel de vida. Infelizmente o planeta é só um. E portanto, pela lei da oferta e da procura, o preço das "coisas disponíveis", aumenta. É uma trágica inevitabilidade. Tão inevitável como o Iceberg que afundou o Titanic.

***

E a Pátria? Que pensará a nossa elite de tudo isto?
Parece que Luís Filipe Menezes caiu. Aléluia! Comentário de um alto-quadro do PSD (cujo nome infelizmente não consegui apanhar - se alguém souber diga-me):
"Se eu estou preocupado com demoras em aparecerem candidatos [à liderança do partido] capazes? Eu espero que todos se entendam até Junho. Não nos podemos esquecer que em Junho começa o campeonato Europeu de futebol e temos todos de estar unidos para apoiar a selecção".

Lembrem-se: é gente deste calibre que nos irá governar durante a crise que aí vem.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Resposta a um comentário

Tive a felicidade de encontrar, pela primeira vez, um comentário de um verdadeiro desconhecido a um dos meus posts (Como no século XIX, afinal). Agradeço a atenção.

Respondo que mantenho a minha opinião, a qual, vale o que vale.

Em todo o caso e tendo em conta o nível e sobriedade do comentário, vou fazer uma correcção no post mudando a forma do tratamento dado aos seus responsáveis para «senhores».
«meninos» (como estava escrito) não reagem, de facto, assim.

Obrigado pelo conselho. Voltem sempre.
Zoompt Rasputine

Panem et Circenses

Ontem fui ao Circo Alvalade XXI ver o meu Sporting bater copiosamente (e com todo o mérito) o Benfica por 5-3 num jogo épico que vem mais uma vez provar que o futebol é de facto uma metáfora da vida. Mostra também que estas duas equipas feridas no seu orgulho, podem ir buscar energias a desconhecidas profundidades e que é precisamente isso, não meramente o facto de ter milhões de adeptos, ou mais títulos que as torna "Grandes".
Só é pena os energúmenos que gravitam em torno das duas equipas (e de outras, também). Foram comigo ao jogo dois primos meus do Benfica, o N. e a J. e, como é óbvio, levaram os seus cachecóis. Embora não tivessem tido problemas no estádio propriamente dito, na ida e sobretudo à vinda, foram brindados com insultos, atitudes ameaçadoras, chegando mesmo um idiota mais exaltado a tentar roubar o cachecol ao meu primo N. Calhou não ter havido problemas como aconteceu comigo quando fui esta época à Luz (roubaram-me o cachecol e se não fugisse ainda levava um murro). Infelizmente, neste país, quando se vai a um estádio, a Constituição é temporariamente suspensa e entra-se numa selvajaria medieval de "nós" contra "eles". Não há direito a opiniões contrárias ou mesmo ao simples direito a ser deixado em paz.
Na Roma antiga, pelo que sei, era a mesma coisa. No Circo Maximus quando os adeptos das equipas verdes, azuis, vermelhas ou brancas se encontravam havia sempre cenas de pancadaria e até mortos. Os adeptos de cada uma juntavam-se em partes diferentes do Circo e aí permaneciam se não queriam problemas ou, querendo problemas, iam à cata de membros isolados dos rivais nas imediações.
Quando, há alguns meses atrás, deixei o Circo da Luz, já sem o meu cachecol, prometi a mim próprio que nunca mais iria voltar a ver ao vivo um Benfica-Sporting, acompanhado ou não. Como quebrei a jura, senti de forma particularmente forte a agitação que se viveu após o jogo, sobretudo quando ela se virou contra pessoas de quem gosto particularmente. Desta vez prometo não voltar MESMO. Fica feita a jura pública.

***

Temo - e temo a sério - que esta gentalha volte a ser usada, como já foi no passado, como tropa de choque para algo de mais sério que clubes de futebol e respectivos dirigentes. Há por ali muita frustação a borbulhar, muita falta de carácter e uma enorme ignorância do mundo.
Aliás, vêm aí, tempos propícios a caos social e a violência organizada. Só falta dar-lhes chefes a valer. Aliás, na Roma antiga, os chefes das facções políticas usavam com agrado os líderes das claques das equipas do Circo Máximo para os seus conspirativos propósitos.
Suspeito que a história se possa repetir se entretanto ninguém, na Republica das Bananas que é este país, tiver mão nestas SA que são as claques. Organizadas ou não.
O problema é que talvez só seja possível semelhante feito se o Circo, afinal o pretexto da sua existência, for por sua vez civilizado. E quem é que vai ter coragem para o fazer, sobretudo quando se aproximam tempos difíceis em que este vai ser cada vez mais necessário para manter o povo entretido?
Pressinto uma serpente a ser chocada no ovo dos estádios de futebol.

domingo, 13 de abril de 2008

Um dia na vida de Rasputine zoompt

Os Sábados foram feitos para coisas assim:
Pegar no carro em boa companhia, partir sem anunciar o destino; mostrar onde se gasta o dia-a-dia na nudez vazia de uma tarde de fim de semana; explorar locais exóticos com a Arrábida ao longe; iniciar conversas; não as conseguir acabar; sentir o «cheiro a verde»; sentir a surpresa da descoberta; contar novidades prenhes de promessas; ver a serra da Lua ao longe; abrir a janela para o calor da primavera afastar os agouros do inverno; rir da tacanhez do que nos envolve; mostrar o destino; ver o mar; cheirar o mar; sentir o mar; brincar com o fogo (mas como faz bem à alma aquele frio na barriga!); chorar mágoas; dar esperança; abeirar-se de matadouros; recusar esplanadas comerciais a brincar ao Colombo; ter desejos; descortinar pastelarias; beber chocolate quente; queimar a língua; ouvi-la falar com a sobrinha; voltar para Lisboa; falar de inflação; falar do fim-do-mundo; rir; procurar a porcaria de um isqueiro que desapareceu; entrar no IC-19 quando se estava a pensar rematar o passeio com a Marginal; olhar o Cacém; mostrar o campo de futebol dos jogos internacionais dos Lusitanos F.C.; deixá-la em casa; ver a sua oliveira-bonsai e pensar que a paisagem à volta é um anti-alentejo; voltar para casa; jantar com os meus pais que apareceram por cá; jogar furiosamente Colonization até à uma da manhã e conseguir a independência dos Estados Unidos em 1685.

Como no século XIX, afinal

A minha amiga M. que está em Luanda, deu sinais de vida! Confesso que já temia por ela mas afinal a sua demora deve-se a motivos explicáveis, embora necessariamente contextualizados na realidade africana: as comunicações com o Hemisfério norte são difíceis, caras e morosas. Como no século XIX, afinal.
Perante os seus olhos, conta-nos, vislumbra-se uma natureza caótica, repleta de automóveis, poluíção e expedientes. Pela savana de Luanda os carros fazem as vezes dos herbivoros, ruminando de um lado para o outro ao ritmo das estações (aparentemente estamos na estação seca, senão ela tinha notado). Não têem, portanto, de evitar os lagos e as correntes de lama. Mas deve haver barulho de buzinas e pó por todo o lado, o qual, misturando-se com o zumbido dos geradores de electricidade, quais insectos, devem dar à atmosfera um elan de enxaqueca permanente, miasmática. Como no século XIX, afinal.
Parece também que esvoaçando como garças boieiras em redor dos automóveis parados no trânsito, centenas de mininos vendem de tudo um pouco, como se as ruas fossem um Centro Comercial formigante espalhado pela nova savana africana, urbana e decadente. Existe mesmo uma interessante flora de cartazes e anúncios pitorescos , tais como:

"Aluga-se máquina de sorda"
"Aluga-se este rei-do-chão"
"Cabeleireiro: entra feio e sai bonito"
"Não deite lixo aqui, deite mais adiante"
"Tiram-se fotos de pen daive"

É tudo tão pitoresco e trágico ao mesmo tempo, não é? Caro leitor - ou antes, cara leitora, pois as mulheres gostam de se mostrar mais sensiveis ao 3º mundo - não sente ao ler estas linhas um arremedo beatífico para ir salvar a África de si própria? Vá-se inscrever na missão/ONG mais próxima. Com alguma sorte, ao fim de três meses a purgar a alma (e os intestinos) no conforto pós-colonial de um qualquer hotel/missão religiosa/sede de ONG situada no asfalto de Luanda, pode voltar à Europa com os olhos rasos de negritude e dizer perante os seus conhecidos "Eu estive na África, ajudei-os a serem um pouco menos eles próprios e sobrevivi! Vejam como sou moralmente superior!"

Mas voltemos à M. que foi para lá com o objectivo bem mais digno de ganhar a vida:
Os nativos não são amistosos. Parece que na ausência de lei prima a lei da bala e do linchamento. Os ladrões e outros meliantes, diz-me ela, quando apanhados são sovados in situ, prova de que na África a justiça não é ainda uma questão administrativa: talião rules it. Como no século XIX, afinal.
Também os víveres essenciais são caros, até para nós. Vejam só esta lista de compras: Um quilo de uvas custa 16 euros. Um pacote de Tampax, 18! uma refeição média, 60€.
Como consequência, os alunos da M., coitados, não podem almoçar no estabelecimento de ensino que frequentam! (Sim a M. foi trabalhar para um estabelecimento público, que julgavam? Que fosse trabalhar para uma empresa privada nativa? ahahahah). Travestida numa roupagem de "formação profissional" continua a imperar a dialéctica missionário/autócne. Como no século XIX, afinal.
Segundo a M. é proibido ligar uma pen-drive aos computadores dos ciber-cafés porque estes estão cheios de virús. Não deixa de ser interessante especular em hipotéticos paralelismos entre a promiscuídade informatica aí existente e os virus biológicos que também abundam em Angola. Como no século XIX, afinal.
Seria lógico, ou pelo menos misericordioso para com a população, que o governo fizesse algo, não acham?
Pois bem: olhem só no que o Zédú está a pensar gastar 2,13 biliões de dólares!
Eu já sabia desta demonstração de megalomania. Porém, devemos pensar nos pobres luandenses que gastam uma hora a uma hora e meia a ir da Ilha ao Miramar (seja lá onde isso for) como li num post de um blog local e respectivos extraordinários comentários feitos por alguns senhores da elite angolana! Como se o trânsito na marginal fosse o maior problema da cidade!
Na realidade, é como no século XIX, afinal: queremos lá saber que os nossos concidadãos estejam a ser escravizados (até c.1840) ou semi-escravizados (depois de 1840). Queremos é chegar depressa à Ilha!
Tal povo, tal chefe...

sábado, 12 de abril de 2008

História de encantar I

A história para encantar que se segue é dedicada à minha colega C. para ela contar, antes de deitar, à sua filha, a qual está doente (nada de grave; uma doença de criança apenas):


Conto do Reino encantando das águas


Era uma vez, no Reino encantado das águas, uma rainha, algumas duquesas, vários condes,
numerosos cavaleiros e uma multidão de camponeses. Durante muitos anos estas pessoas viviam felizes e contentes nas diversas vilas e aldeias do país das águas. Um dia, veio um dragão e colocou uma nova rainha no lugar da anterior enquanto que, libertando fogo pelas narinas, ameaçou todos os habitantes, nobres e vilões, com a maldição da "privatização", uma coisa horrível que iria modificar a vida de todo o reino.
A princípio, depois do dragão desaparecer misteriosamente no ar (tornou-se invisível), os habitantes do reino ficaram todos muito quietos, esperando que a sua inactividade dissolvesse o encanto maléfico caído sobre o reino. Infelizmente, a nova rainha desatou quase de imediato na criação de novidades sucessivamente mais aterradoras, sobressaltando todos, da duquesa ao mais infímo camponês. Primeiro mudou-se a bandeira do reino e todos resmungaram pelo dinheiro gasto. Depois cortou-se nos rendimento da gleba dos camponeses, aumentando-se a jorna de cada um (os nobres não foram muito afectados, claro) e do seio do povo ergueu-se até aos céus um uivo de angústia. Depois veio uma nova forma de transmitir a informação entre os habitantes do reino, coisa que obrigou todos a trabalharem mais depressa e, o que é pior, a saberem-se vigiados por pequenos gnomos dentro dos respectivos computadores que marcavam o dia de conclusão prevista para o trabalho. Finalmente despenhou-se sobre o reino a anunciada mudança de pouso dos moradores do reino. A rainha indicaria novas moradas para todos, desde a duquesa até ao pequeno camponês. Nobres que toda a vida haviam vivido em determinada vila teriam agora que mudar-se para o outro extremo do reino; camponeses ter-se-iam de levantar mais cedo para cumprir a sua jorna num alqueire mais distante que o habitual. Houve até um conde, ante o desespero de se ver arrastado do seu bucólico castelo - onde era um pacífico quase-rei - para um esquecido canto da capital do reino que ameaçou simular loucura - como Ulisses - esperando que o deixassem em paz no rame-rame do costume, mas longe dos olhares da corte.
De facto, muitas vidas, sobretudo entre os camponeses, ficaram subitamente mais complicadas. O desespero emprenhou-se mais e mais entre todos.

***

A tenacidade da natureza lusitana é, porém, um nada garboso principe que há-de matar o dragão a golpes de passividade, qual espessa lama capaz de emperrar o mais tenebroso feitiço. Tal como a Equity Private explicou, para uma outra sociedade, "Man is basically lazy. Innovative and complex incentive and disincentive structures must be continually created and refined to compel any desirable behavior (including the absence self-destructive behavior). Excessive gaming of the system will be employed at every opportunity to avoid doing anything resembling work." (post: Kierkegaard, Scientologists, Private Equity). Portanto, a cada uma das novidades impostas ao Reino, cada uma das classes - e à sua própria maneira - tratou de adaptar-se, buscando continuar a praticar os velhos hábitos sob novas roupagens. Um exemplo interessante é o de um certo escudeiro - membro, portanto, do mais baixa estrato da nobreza, logo abaixo dos condes - que leva o procedimento acima descrito a níveis verdadeiramente artísticos.
Calhou um dos camponeses sob sua tutela ter encontrado hoje, a seguir ao almoço, um dos cavaleiros conhecidos do referido escudeiro que informou - rindo - que ele se encontrava no castelinho de que é responsável. Dizia o cavaleiro: "Aquele
#*@*% da #%#* está a fazer que trabalha lá no castelinho. Pica o ponto e depois fica por ali a brincar no computador. Mas hoje, já soube mandar a boca que eu [o cavaleiro] venho mandriar ao Sábados e depois pisgo-me. É um %##@ de !%#=#". Riram-se ambos e o camponês pensou para consigo, em jeito de moral da história:
"Por mais voltas que dêem a este Reino, os seus habitantes hão-de encontrar sempre jeito de criar novas vantagens pessoais usando o próprio caos provocado pela mudança. É tal e qual como no Leop
ardo do Lampedusa: é preciso que algo mude para que tudo fique na mesma".


terça-feira, 8 de abril de 2008

Brinde

Por vezes a imitação é uma elevada forma de homenagem.
Esta é uma dessas vezes.
Sei de alguém que teve a excelente ideia de criar um blog de poesia (e não só) mas que o deixou a marinar, à espera não sei de quê. Gostei especialmente da lógica do blog e da maneira como são escolhidos os posts. Além disso, pareceu-me - em conversa tida - que precisa de voltar ao seu blog, para se aliviar um pouco das suas pesadas responsabilidades... Hum...

Como ela não se mexe, dou-lhe um empurrãozinho:

Decidi mesmo interromper, a partir deste breve post, a lógica do meu blog e fazer algo que nunca achei possível que viesse a acontecer na Cabine: dar-vos a ler um brinde de poesia.
É uma lógica parva, eu sei: proponho-me escrever sobre coisas "sérias" (que tolice!) e depois admiro-me por algumas pessoas acharem que tenho uma mente alemã: seca e rigorosa. Às urtigas! Sabe bem quebrar regras por uma boa causa...

Aqui vai então o meu plágio à ideia, embora ligeiramente modificado, porque eu - confesso - prefiro a poesia acompanhada por música. Espero que gostem. Aliás, quem não sentir um arrepio na espinha a ouvir a voz desta mulher e o ritmo desta melodia deve consultar um veterinário porque não deve ser humano...

Antes de lerem os versos, por favor, cliquem no link e abram numa nova janela (serão conduzidos ao YouTube)

Shirley Bassey (1966)

Shirley performs this CLASSIC Cole Porter song, "I Get a Kick Out Of You." This song was originally recorded and released on Shirley's Columbia




My story is much too sad to be told,
But practically everything leaves me totally cold.
The exception I know is the case
When I'm out on a quiet spree,
Fighting vainly the old ennui,
And I suddenly turn and see your fabulous face.

I get no kick from champagne.
Mere alcohol doesn't thrill me at all.
So tell me why should it be true
That I get a kick out of you?

Some, they may go for cocaine.
I'm sure that if I took even one sniff
It would bore me terrifically, too.
Yet I get a kick out of you.

I get a kick every time I see
You standing there before me.
I get a kick though it's clear to see
You obviously do not adore me.

I get no kick in a plane.
Flying too high with some gal in the sky
Is my idea of nothing to do.
Yet I get a kick - um you give me a boot - I get a kick out of you.

segunda-feira, 7 de abril de 2008

Mude-se o povo nº2

Luís Filipe Menezes terá enlouquecido? Ou será que aquela do "sulistas, elitistas e liberais" era apenas o primeiro indício público do que hoje se vê e constata mas não se acredita?
Hoje no Público li a seguinte enormidade: "Menezes promete à Madeira autonomia sem limites e uma nova constituição". Ainda segundo o Público: garantiu [...] que, "com um PSD nacional à moda da Madeira", vai derrubar o Governo de Sócrates em 2009. Mas não é tudo: também quer estender este conceito de autonomia ao resto do país (ressuscitando o nado-morto do regionalismo) e ao próprio partido: serão as bases do partido a escolher, a partir de 2009, os deputados a candidatarem-se à Assembleia da República! Imagine-se! E ninguém reage?
Estamos portanto nisto: o maior partido da oposição e - até este dia - única alternativa ao governo de Sócrates quer transformar-se numa espécie de Partido Peronista. Temo por Portugal... se este energúmeno for algum dia eleito primeiro-ministro, o nosso país afundar-se-á num Chavismo de direita.
É, sem dúvida, a atitude política ideal para enfrentar os problemas que nos esperam, a saber: colapso financeiro mundial, pico petrolífero e alimentar e crise ambiental generalizada.

***

Apesar de (quase) sempre ter votado em branco, o PSD ocupa a posição ideológica com a qual eu mais me identifico: o centro-direita. Infelizmente, já não é nada disso. Se as ideias deste senhor forem para a frente, teremos Menezes, ou outro como ele, eleito para todo o sempre; o PSD transformar-se-á então num balão de hidrogénio ao qual a mais pequena faísca fará explodir. Entenda-se: o que virá com Menezes não é pois o que mais me preocupa. É o que virá depois. A democracia só funciona com partidos fortes na oposição. Se o PS não conseguir ter um par à sua semelhança para dançar a dança do rotativismo democrático a IIª Republica terá os dias contados. E tendo em conta o que aí vem em termos mundiais não sei se nos poderemos dar ao luxo de entrar nesse periodo turbulento já sem liberdade política.
Volta Marques Mendes. Estás perdoado...

Mude-se o povo nº1

"Mude-se o povo, se não se pode mudar o governo" disse B. Bercht quando o seu povo o desiludiu pela última vez.
No meu caso, é duro constatar que todos os dias penso nesta frase. Hoje, porém, aconteceu uma coisa no meu ganha-pão que me encheu as medidas. O sujeito - um velho, vejam só - já havia aparecido por ali umas quantos de vezes, sempre com o mesmo pedido. Tentámos fazer os possíveis. Infelizmente o sujeito não tinha a coluna vertebral necessária para pôr o seu pedido por escrito. Pior, despedia-se sempre com estas palavras: "veja lá, não lhes vá contar que eu vim aqui".
Poltrão, como todos os bufos, portanto.
E qual era o seu objectivo? É simples: queria que nós fizessemos o trabalhinho sujo que ele não tinha coragem para fazer.
Dissimulado, como todos os impotentes, concerteza.
Hoje apareceu histérico: o seu problema continuava. Eu pedi-lhe que colocasse tudo por escrito, tentando acabar com a comédia.
Ele insistiu, surdo às minhas palavras. Levantou a voz: insinuou que eu não estava a fazer o meu trabalho como devia de ser! E que este era uma país de merda. E que eu (e o meu ganha-pão) não ligávamos nenhuma aos honestos trabalhadores e protegiamos os gatunos!
Grotesco, como todos os mediocres, afinal.
Acabámos aos gritos; eu ameacei pô-lo na rua, como se fosse um aluno mal comportado. A minha colega chamou o segurança. Ele desatou a chamar-nos nomes do mais denso vernáculo. O segurança pegou-lhe pelos colarinhos e largo-o no exterior com estrondo. Pormenor curioso: estava uma cigana (protagonista de peixeiradas anteriores, mas mais softs) entre os outros clientes presentes. Dizia, abanando a cabeça: esta gente não se sabe comportar!
Acabou sentado no passeio do nosso parque de estacionamento: os meus colegas do andar de cima aproximaram-se dele para o ouvir chamá-los de chulos e coisas semelhantes. Por ali ficou, como um cão enxotado.
Depois chegou a polícia que fez a «ocorrência» e escoltou-o até à saída.

***

Houve um tempo em que eu usava a expressão "entre a esquadra e o bordel" para descrever alguns dos meus clientes. No que me diz respeito, e a partir de hoje, já só falta o bordel.
Que raio de modo de ganhar a vida!...

As minhas guerras nº2

A Oeste nada de novo. Continua incessante, como esta chuva de Abril, a minha barragem de artilharia às posições inimigas. Se do ar se visse esta paisagem dir-se-ia a lua, tantas as crateras criadas. E o bombardeamento continua. Pequenos morteiros, grandes obuses; até dos aviões que de momento ainda apenas servem para sondar o movimento da força opositora, se largam granadas, lançadas pelo fotógrafo, à mão.
A minha força aguarda, encolhida nas profundezas das trincheiras recuadas. A 1ª linha, demasiado próxima do rebentar dos meus próprios obuses queda-se deserta. Todo o meu exército aguarda que a chuva de aço e fogo passe.
Começou prometedora a barragem na nova frente. Mas ai! Eis que a esta chuva de concepção humana se somou a chuva de água, vinda de cima, como se a natureza subitamente desperta (mas porquê, por quem?) quisesse arrefecer o momento em que antevi a brecha.
Por isso é necessário aguardar e insistir no bombardeamento pesado. Que ninguém ouse sair ainda da protecção do abrigo! Às defesas somam-se agora poças de lama fundas provocadas pela minha própria artilharia. Que irei encontrar à minha frente?
O vinho foi servido; é forçoso bebê-lo.

domingo, 6 de abril de 2008

Olimpiadas do disparate

A excelência moral do Ocidente volta a atacar. Sob a inesperada neve primaveril que caiu durante o dia de Domingo uma corrida de apanha-a-chama-olimpica desenrolou-se em Londres durante todo o percurso desta, ou seja, do estádio de Wembley até à Arena O2 em Greenwich. Depois dos treinos na Grécia (a extrema esquerda grega sempre tão dada a manifs primou pela candura) este novo desporto olímpico suscitou grande interesse na Inglaterra. Aparentemente a organização inglesa do transporte da chama olímpica julgou exorcisar os escrúpulos dos mistícos ocidentais chamando ao evento "Journey of Harmony", expressão que pode ser traduzida, no contexto, como "corrida da harmonia". Esqueceram-se que o moderno misticismo ocidental (desde que exercido num ambiente favorável, claro) é talvez o mais tenaz movimento de massas do mundo contemporâneo. Se deseja algo não descansará enquanto não o tiver demonstrado na televisão. O resultado prático no proclamado alvo a abater é secundário, até porque gosta particularmente de causas perdidas. O seu único e verdadeiro alvo é, porém, o próprio umbigo, descendente contemporâneo da glândula pineal do Descartes, o local onde a alma do homo occidentalis moderno entra em contacto com o corpo e se torna «verdadeiramente» humano.
A moda da semana é odiar o governo chinês por causa do Tibete e, consequentemente, tudo fazer para atrapalhar os jogos de Pequim. Também o Darfur foi metido no mesmo saco pelos manifestantes.
É escusado tentar fazer perceber os místicos ocidentais que se querem lutar contra o governo chinês estão a mordê-lo no sítio errado. Em todo o caso faço uma tentativa:

- A China exporta milhões e milhões de objectos (muitos deles inúteis) para o Ocidente: desde t-shirts a esferográficas e computadores. Alguém verifica as etiquetas e aje conforme? Não. Diz a sabedoria convencional: Isso é impossível, os nossos produtos (ou seja os nossos empregos) são mais caros!

- A China compra com o dinheiro das suas exportações os bonds que garantem as hipotecas das casas que compramos do Cacém a Tucson, e em particular, dos cartões de crédito. Alguém se coibe de comprar, usando o cartão de crédito, o mais recente IPod? Alguém compra a casa a pronto, ou pelo menos aluga-a, como fazia antigamente a classe média, em vez de entrar no primeiro banco que vê, endividando-se até aos cabelos? Não. Diz a sabedoria convencional: alugar casas é para os pobres e pagar a pronto é para os ricos.

- A China, ao contrário da África, por exemplo, acha que o capitalismo é afinal uma boa ideia para sair da Idade Média para onde se retirou no século XV. Alguém pensou nas consequências que este despertar teria na posição dominante do Ocidente e consequentemente nas suas ideias, como a democracia? Não. Diz a sabedoria convencional: Eles têm o direito a ter o nosso nível de vida e são um mercado muito bom para fazer negócios da China. Para o diabo o planeta, e para o diabo os racistas dos Ocidentais brancos e previligiados e para o diabo os seus empregos e a sua civilização.

A China candidatou-se e ganhou a organização dos Jogos Olimpicos de 2008. Faz parte do misticismo ocidental achar que os Jogos Olimpícos devem estar acima da política. Jimmy Carter foi vilipendiado por ter boicotado os Jogos de Moscovo: gritou-se então que era contra a paz e o entendimentos dos povos. Muitos dos místicos que vemos a chorar o Tibete vilipendiaram esse presidente americano pela sua posição. Agora chamam nomes por não se boicotar os Jogos de Pequim. Em que ficamos, então? Que excelsa qualidade faltava aos afegãos e aos Europeus de Leste que os Tibetanos parecem agora ter?

Esta gente enche-me as medidas: tenho um crescente nojo pelos místicos do Ocidente, nojo só superado pelos políticos que eles elegeram ou deixaram eleger como resultado da incapacidade de castrados que são por não serem já capazes de gerar um Trotsky.

Falta agora aguardar pelo round do apanha-a-tocha-olimpica em Paris. Os místicos ocidentais franceses são ainda mais patéticos e o Sarkozy vai exercer todos os seus poderes de Humpty-Dumpty para dar à França e ao mundo uma imagem de manifestante-comandante de carga polícial como só os politicos franceses sabem dar.

Uma última palavra, esta de apreço: a polícia inglesa é de facto uma das mais civilizadas organizações do mundo. Vejam só como eles conseguiram gerir a coisa com a dose certa de dureza, contenção e respeito por quem demonstra a sua opinião.

Pareciam pastores a conduzir um rebanho de ovelhas assustadas.
Os manifestantes, nem que seja só por isto, deviam ter vergonha na cara.

sábado, 5 de abril de 2008

Foto Safari aos Conventos

As prometidas visitas aos Conventos já foram realizadas bem como as fotos. Segunda-feira, nova visita à Faculdade para entregar à S. os resultados do presente safari, portanto. Só espero que as gravuras antigas do convento, enviadas a partir do computador da Irmã R. não se tenham perdido no ciberespaço ou dado meia volta ao esbarrar na satanica realidade da minha conta de mail. De facto, são agora 22h00 e ainda nada: vazio que me parece um ominoso sinal. Só espero que tenham chegado ao site do Centro.
Necessário é agora realizar a prometida reflexão sobre os Conventos e os seus habitantes (ver post Plácidos Domingos).
Em primeiro lugar o novo convento: por fora é todo ele modernidade. Ou seja é monilitíco como o cimento de que é feito. Existe mesmo a omnipresente relva selvagem irrompendo pelo betão do chão do parque de estacionamento (tem um sim, os antigos conventos não dispunham de cavalariças? Então?). O cimento das paredes exteriores e as grades do portão de entrada mostram na carne os flagelos da atmosfera lisboaeta. Não se trata de incúria; trata-se da realidade da arquitectura modernista, ela própria um reflexo do tempo que a concebeu: é muito bonita e luzídia ao princípio mas com o tempo e por causa dos materiais escolhidos, dissolve-se na paisagem. O estado final do edifício modernista, suspeito, não são ruínas melancólicas mas escombros de betão corroído e ferros ferrugentos. Isto é irónico ao ponto de ser trágico, duas qualidades ausentes destes tempos finais: afinal a natureza irrompe através do cimento com muito mais facilidade do que através da pedra e do mármore.
Existe paz no exterior; no sentido em que existe paz num bairro social ao Sábado de manhã. Passa por entre aquelas paredes erectas em cimento armado um vento vazio muito diferente do vento deserto que se sente soprar, por exemplo no Mosteiro da Arrábida, junto às curvas dos Ermitérios.
Por falar em curvas: porque diabo a arquitectura modernista é despojada de curvas? É irónico - uma vez mais - que na era da libertação da mulher a arquitectura não possua uma gota feminina. É uma paisagem de menires paralelipipedais erectos em direcção ao céu e ao sol, elementos masculinos por excelência. E não me venham falar que a arquitectura moderna também tem curvas, como este grotesco absurdo austriaco. Estas frívolas demonstrações da cultura contemporânea tem tanto de feminino, como por exemplo, um Imperial destroyer. Digam-me: sou só eu ou vocês também notam as semelhanças?

Mas voltêmos ao Convento. Por causa da minha incurável preguiça, só toquei à porta do dito por volta da 13h00 o que talvez confirme o adágio de que "à hora do almoço aparece sempre mais um". O "irmão-porteiro" recebeu-me e, após uma breve hesitação ("nós almoçamos às 13h15", disse-me) decidu-se a mostrar-me a casa. Notei que não envergava hábito.

O interior é bastante belo, diga-se. Há de facto uma paz genuína e é um sítio acolhedor. O claustro é aprazível: parece um jardim japonês e dele vê-se a igreja e algumas salas através de grandes vidraças ao nível do chão, levemente escurecidas. O recinto parecia convincentemente isolado do mundo abrindo num quadrilátero para o céu que entretanto azulara de novo - estava e esteve um dia sempre cinzento e baço, hoje. Pensei: será que em domingos de jogo grande o bruá das massas histéricas do coliseu ali ao lado vem perturbar a paz dominical dos monges?
Só me pareceu que o claustro carecia de um pouco mais de espaço. Também não vi bancos. E porque razão não existe aquela espécie de corredor a toda a volta (escapa-me o termo técnico) enquadrado por colunas e arcos que se costuma ver nos conventos tradicionais? Parecem-me tão adequados à contemplação os bancos de pedra sempre presentes nesses corredores (vem-me à lembrança o claustro do extraordinário convento de Santi Quattro Coronati em Roma).

Dirigimo-nos depois para a Igreja, sem dúvida o ex-libris do convento. Aqui gostei verdadeiramente do que vi: a nave é espaçosa , solene e acolhedora ao mesmo tempo. Existe uma luz indefinida e diáfana que se mistura muito bem com a penumbra. Descobri que a luz do dia cai para o chão através de uma abertura lateral encaixada a todo o comprimento da nave. Existe também a atrás referida janela para o claustro que por sua vez faz entrar mais luz e, junto ao altar, um imenso, mas localizado, jorro de claridade branca vinda do céu ressalta na alvura do pano branco sobre a ara. O betão, escuro, absorve toda esta luz e mostra, afinal, como este material pode propiciar resultados felizes.

Em relação às celas, julguei serem mais numerosas. Encontram-se todas num corredor com uns vinte metros de comprimento. À primeira vista parece tudo muito desarrumado e o irmão que me servia de guia pediu desculpa por não me deixar fotografar a sua cela, pois "está caótica". Um olhar mais atento, porém, verifica que aquela é a dessarrumação própria dos espaço de muito trabalho: pilhas de livros ocupam carrinhos de transporte como aqueles que existem nas bibliotecas e há, por todo o lado, caixotes com mais livros por desembrulhar. Lembrei-me da maqueta que vi na área comum do convento e que ostentava, orgulhoso, um espaço destinado a Centro Cultural: que pena não ter sido construído! Seria bem proveitoso à minha freguesia e um polo de atracção para visitantes e estudiosos: teria um pequeno Cluny à porta de casa! Espero que a Câmara de Lisboa quando sair da falência e a Junta de Freguesia quando sair da dormência se lembrem que têm este projecto de interesse público para servir de contrapeso à vendilhice do Colombo e às actividades circenses do Coliseu da Luz. Tive pena de não lhe ter pedido para espreitar a biblioteca e o scriptorium; porém a hora que era inibiu-me de lhe fazer mais pedidos e, após mais algumas fotografias, abandonei o convento deixando o esfomeado irmão ir sacear a sua fome.

***

Às 16h30 sob um céu cinzento e baço, prenhe de trovoadas, apareci com o meu amigo T. e a namorada, a A. (que é arquitecta), à porta do palacete onde a religiosa portuguesa Teresa de Saldanha fundou e instalou a casa-mãe das Irmãs Dominicanas de Santa Catarina de Sena. Trata-se também de um estabelecimento Dominicano, embora com recursos muito mais humildes que os seus poderosos irmãos. Esta família da Ordem Dominicana feminina, fundada por uma portuguesa no século XIX, pelo que me pude aperceber, conheceu demasiadas vissicitudes causadas pela turbulenta história portuguesa dos séculos XIX e XX para poder prosperar com maior tranquilidade. Mesmo assim, do esforço resultou uma comunidade bastante simpática, a qual, ocupa com a sua creche, escola-refúgio para crianças com problemas sociais e edifício administrativo, metade do palácio que já foi seu e que agora o Estado faz a mercê de emprestar às irmãs. Aos poucos, o espaço vai sendo recuperado. Mas é visível que cada camada de estuque , cada lâmpada de electricidade e cada criança albergada deve provocar um escrutíneo mais denso que o do actual ministério das Finanças nos ordenados dos funcionários públicos dos Índices e escalões mais baixos (claro).
Notei um certo azedume para com o Estado, identificado com um "eles" de som ligeiramente amargo: 1910, e o que se calhar é pior, a desatenta e sovina actual IIª Republica, são realidades presentes e madrastas. Deve ser duro ocupar um espaço que lhes foi dado pela fundadora e serem tratadas como um qualquer inquilino.

O espaço em si não é propriamente um convento no sentido em que o edifício dos Dominicanos homens é. Este é um espaço que gira em torno das crianças que serve e da administração das actividades da Ordem. Ironicamente é, à sua maneira, um espaço mais ligado ao meio social envolvente que o Convento dos homens: é mais improviso e mais adaptação; a arquitectura do espaço é uma sucessão de estilos e remendos resultantes da situação algo precária de inquilinos e da sua irrequieta história. Não foi construído de raiz em dois anos e cinzelado com tiques e toques modernistas; foi feito por várias pessoas, instituições e nascido de desejos por vezes contraditórios dos seus sucessivos ocupantes. Tem também outra qualidade, a qual se nota nos jardins (os quais, segundo me disse a Irmã R. já foram em tempos maiores e mais belos que os do Marquês de Fronteira ali ao lado). Os jardins são entrecortados com hortas e arvores de frutos. Ali não há flora zen. Mas há pássaros a esvoaçar e abelhas zumbindo e existe um dessassossego vegetal que deixa adivinhar a existência de um verdadeiro ecossistema vivo e em constante adaptação.
Como o resto do local, aliás.

quinta-feira, 3 de abril de 2008

Surpresa no Zimbabwe

Será possível que Robert Mugabe tenha perdido as eleições Presidenciais e o seu partido as parlamentares no Zimbabwe, como acabei de ver na net?
Se é esse o caso podemos estar perante o caso de assistirmos ao nascimento da verdadeira democracia em África: governantes derrotados nas urnas!
Esqueçam a África do Sul. Nesse país, até agora, o que vimos foram três eleições livres e sossegadas e uma transição de regime milagrosamente suave (pelos padrões africanos). Mas mesmo na África do Sul, chamo à atenção, ainda não assistimos a remoção de um governo através de eleições: os acontecimentos de 1994 foram uma mudança de regime decidida por consenso e arbitragem internacional. A eleição de Mandela veio depois das agulhas estarem todas acertadas em infinitas reuniões de uma coisa chamada CODESA (Convention for a democratic South Africa).

Isto que está a acontecer no Zimbabwe é comida para o pensamento. Então não é que eles conseguiram?
Aguardemos pelos acontecimentos. Quando a coisa estiver mais definida farei um comentário.
Ah! é verdade: a caricatura é da autoria do Zapiro, o meu caricaturista preferido. Vão ver os desenhos dele ao Mail & Guardian, um dos mais interessantes jornais desde planeta.

quarta-feira, 2 de abril de 2008

Futebol ao entardecer

Jogo dos Lusitanos F.C. na Ameixoeira.
Pela primeira vez começámos um jogo com a gloriosa luz do sol iluminando a nossa destreza em campo. Consequências da mudança de hora. Desta vez os meus primos não puderam comparecer embora tenham prometido vir para a semana. Mesmo assim foi suficientemente divertido para, duas horas depois, ter suado do nosso esforço o resultado de 8-7 para a equipa que não me teve como guarda-redes.
A S. e o Prof. E. compraram uma bola nova. Infelizmente é tão levezinha que servirá, quando muito, para jogos de voleibol! Tivemos de jogar com uma bola dura como pedra, gentilmente cedida pelo B., o encarregado do campo que também joga connosco.
Toda a gente se queixou do calor: ao fim de dez minutos de corrida já toda a gente jogava de t-shirt, até este vosso cronista, que é guarda-redes e necessita de todo o poder almofadado do fato treino quando cai no cimento duro do chão.
Consequência ou não, o número de lesões dolorosas foi, parece-me, maior neste jogo que nos anteriores. Só a minha pessoa magoou seriamente o dedo grande do pé (pontapeei o chão em vez da bola!) e o joelho esquerdo. Ambos os sítios ainda emitem dor na altura em que escrevo: meio dia do dia seguinte. A propósito: não liguem à data do post, serve apenas para manter a coerência cronológica...
E é tudo da frente desportiva. Sexta-feira volto a ver os lusitanos (embora na variante académica) por causa do "Projecto Lázaro". Não me posso esquecer de levar à C. os dez Euro do livrinho que comprei ao Centro no cocktail do Padre M.A.!

terça-feira, 1 de abril de 2008

Cimeira da Nato em Bucareste

Os líderes do Ocidente Cristão estão neste momento a chegar à capital da Roménia, Bucareste, para mais uma Cimeira da NATO. Trata-se essencialmente de uma demonstração de unidade da elite política perante os povos que juraram defender. Ver Website aqui.
Deste lado do cordão de segurança, desde jornalistas aos iluminados do costume, todos procuram, por sua vez, provar ser esta a cimeira que irá mudar tudo ou acabar com tudo. Esta apocalíptica certeza pairara já em Riga há dois anos atrás; agora o ritual repete-se. Possivelmente com o mesmo cerimonial litúrgico das manifestações anti-globalização e das fotografias da praxe, seguida pelo climax cálido das declarações ocas e o embrulhar da tenda para, daqui a dois anos, tudo voltar à mesma (apropriadamente, para dar um de "desafio" numa cidade do leste da Europa). Estas Cimeiras quando comparadas com os seus distantes antepassados, os "Congressos" do século XIX, sobram em «mediatismo» o que lhe falta em substância. É paradoxal: os Congressos eram quase encontros de iniciados mas os seus resultados eram públicos e percebidos por todos; estas cimeiras arrastam centenas de jornalistas e alguns milhares de peregrinos (de analistas, consultores e fornecedores de logística aos místicos semi-profissionais das "manifs") e qual é o sumo da coisa?
Alguém se lembra do que foi decidido em Riga?

Em parte a grande diferença reside, não como se poderá superficialmente imaginar na "complexidade do mundo actual", lugar-comum oco, mas na diferença de mentalidades nos políticos e nas respectivas sociedades. Veja-se a situação do mundo em 1878, quando se reuniu o Congresso de Berlim: era pelo menos tão complexo como o actual (descontando os problemas ambientais). E o que é mais irónico, era complexo precisamente nos mesmos locais que agora pesam nas mentes de participantes directos e indirectos, a saber: Balcãs e Afeganistão. A Rússia é o grande protagonista, presente em 1878 e ausente agora por razões óbvias. O destino do decadende mundo islâmico o ruído de fundo (O colapso lento do Império Otomano e o Afeganistão em 1878; o Kosovo e o Afeganistão agora). Curioso, não é?

Actualmente parece tudo muito mais desligado do mundo real; a coragem de falar claro relativamente aos escolhos geo-políticos (ou sejam onde terminam as respectivas áreas de influência) foi substituída pelo medo de que algures, em alguma sondagem, se percam pontos percentuais por não se respeitar os "direitos humanos" ou por se estar ao serviços de "interesses". Ao mesmo tempo os políticos devem manter quentinhos os seus eleitores, os quais, habituados como estão a que lhes façam todas as vontades, não se dispõem a fazer a mínima concessão neste capítulo, ainda que na prática, algum povo bárbaro se lixe para que isso seja possível. Queremos virtude e ao mesmo tempo conforto!
Que diriam os nossos antepassados?

Falemos claro: a expansão da NATO para os Balcãs e para a Geórgia (Estaline deve estar às voltas) enfurece a Rússia que vê o Ocidente e o que é pior, o estilo de vida ocidental cada vez mais próximo do centro do Império e das sua maior fonte de petróleo: o eixo Baku-Grozny-Maykop. Por essa razão a França e a Alemanha não pretendem que a Ucrância, a Geórgia e os países balcânicos entrem na Aliança: não querem perturbar o urso russo que fornece o gás natural mais barato disponível à Europa.
Por outro lado os Estados Unidos cujo gás natural vem de outros lados quer um avanço da NATO o mais possível para Leste a fim de emparedar os Russos e meter uma cunha a norte do Médio Oriente. É o braço de ferro entre estas duas correntes que estará em cima da mesa na Cimeira de Bucareste.
Este desejo expansão é, na minha opinião, aceitável pois expandir a NATO significa expandir o Ocidente e o seu modo de vida. É o primeiro degrau para o estabelecimento de sociedades minimamente coerentes nesses recondidos sítios. Mais: os russos não poderão fazer absolutamente nada: fecha a torneira do gás? Nós somos os seus melhores compradores e a China usa carvão (que dispõe em abundância para aquecimento e electricidade); não precisa, como nós, do gás russo. É precisamente por se saber fraca que tanto tem esbracejado contra esta expansão e contra, por exemplo, o sistema americano de defesa anti-missil.

Infelizmente isto não é assim percebido pela generalidade do público ocidental que do fundo do seu conforto muge aflito sempre que o Ocidente conhece alguma vantagem, mesmo em território cujas sociedades são susceptiveis de serem ocidentalizadas em profundidade. O desejo de virtude é a nossa única verdadeira religião, de facto. Isso e permanecermos quentinhos no Inverno resmungando contra o «parvo do Bush».

Ir-se-á ouvir por parte dos Europeus durante esta cimeira (através de insinuações, claro) o argumento de que a NATO serve apenas para a defesa do Atlântico Norte. Este argumento é também usado pelos detractores da guerra no Afeganistão. Relembro, porém que a Organização só tem esse nome porque depois da 2ª Guerra Mundial se recuou com horror perante a ideia de que o Ocidente seria um todo coerente e passível de ser defendido com uma organização de alcance mundial. A luta contra o poder soviético foi, lembro, lutada região a região através de réplicas fantasmagóricas da NATO (SEATO, ALADI, etc). Na altura e depois nos anos 60 e 70 este auto-horror expandiu-se (alimentado pelo comunismo internacional - chamêmos os bois pelos nomes) e de tal maneira se pegou ao discurso político que depois da queda do Muro muito boa gente se opõs à expansão desta para os países do derrotado Pacto de varsóvia.
Agora esse discurso é usado para fazer festas ao Urso Russo a fim do gás natural continuar a fluir. E ainda - ao mesmo tempo - se clama contra o aquecimento global!
É lamentável!
Que diriam os nossos antepassados?
Que dirão de nós os nossos descendentes?