domingo, 13 de abril de 2008

Como no século XIX, afinal

A minha amiga M. que está em Luanda, deu sinais de vida! Confesso que já temia por ela mas afinal a sua demora deve-se a motivos explicáveis, embora necessariamente contextualizados na realidade africana: as comunicações com o Hemisfério norte são difíceis, caras e morosas. Como no século XIX, afinal.
Perante os seus olhos, conta-nos, vislumbra-se uma natureza caótica, repleta de automóveis, poluíção e expedientes. Pela savana de Luanda os carros fazem as vezes dos herbivoros, ruminando de um lado para o outro ao ritmo das estações (aparentemente estamos na estação seca, senão ela tinha notado). Não têem, portanto, de evitar os lagos e as correntes de lama. Mas deve haver barulho de buzinas e pó por todo o lado, o qual, misturando-se com o zumbido dos geradores de electricidade, quais insectos, devem dar à atmosfera um elan de enxaqueca permanente, miasmática. Como no século XIX, afinal.
Parece também que esvoaçando como garças boieiras em redor dos automóveis parados no trânsito, centenas de mininos vendem de tudo um pouco, como se as ruas fossem um Centro Comercial formigante espalhado pela nova savana africana, urbana e decadente. Existe mesmo uma interessante flora de cartazes e anúncios pitorescos , tais como:

"Aluga-se máquina de sorda"
"Aluga-se este rei-do-chão"
"Cabeleireiro: entra feio e sai bonito"
"Não deite lixo aqui, deite mais adiante"
"Tiram-se fotos de pen daive"

É tudo tão pitoresco e trágico ao mesmo tempo, não é? Caro leitor - ou antes, cara leitora, pois as mulheres gostam de se mostrar mais sensiveis ao 3º mundo - não sente ao ler estas linhas um arremedo beatífico para ir salvar a África de si própria? Vá-se inscrever na missão/ONG mais próxima. Com alguma sorte, ao fim de três meses a purgar a alma (e os intestinos) no conforto pós-colonial de um qualquer hotel/missão religiosa/sede de ONG situada no asfalto de Luanda, pode voltar à Europa com os olhos rasos de negritude e dizer perante os seus conhecidos "Eu estive na África, ajudei-os a serem um pouco menos eles próprios e sobrevivi! Vejam como sou moralmente superior!"

Mas voltemos à M. que foi para lá com o objectivo bem mais digno de ganhar a vida:
Os nativos não são amistosos. Parece que na ausência de lei prima a lei da bala e do linchamento. Os ladrões e outros meliantes, diz-me ela, quando apanhados são sovados in situ, prova de que na África a justiça não é ainda uma questão administrativa: talião rules it. Como no século XIX, afinal.
Também os víveres essenciais são caros, até para nós. Vejam só esta lista de compras: Um quilo de uvas custa 16 euros. Um pacote de Tampax, 18! uma refeição média, 60€.
Como consequência, os alunos da M., coitados, não podem almoçar no estabelecimento de ensino que frequentam! (Sim a M. foi trabalhar para um estabelecimento público, que julgavam? Que fosse trabalhar para uma empresa privada nativa? ahahahah). Travestida numa roupagem de "formação profissional" continua a imperar a dialéctica missionário/autócne. Como no século XIX, afinal.
Segundo a M. é proibido ligar uma pen-drive aos computadores dos ciber-cafés porque estes estão cheios de virús. Não deixa de ser interessante especular em hipotéticos paralelismos entre a promiscuídade informatica aí existente e os virus biológicos que também abundam em Angola. Como no século XIX, afinal.
Seria lógico, ou pelo menos misericordioso para com a população, que o governo fizesse algo, não acham?
Pois bem: olhem só no que o Zédú está a pensar gastar 2,13 biliões de dólares!
Eu já sabia desta demonstração de megalomania. Porém, devemos pensar nos pobres luandenses que gastam uma hora a uma hora e meia a ir da Ilha ao Miramar (seja lá onde isso for) como li num post de um blog local e respectivos extraordinários comentários feitos por alguns senhores da elite angolana! Como se o trânsito na marginal fosse o maior problema da cidade!
Na realidade, é como no século XIX, afinal: queremos lá saber que os nossos concidadãos estejam a ser escravizados (até c.1840) ou semi-escravizados (depois de 1840). Queremos é chegar depressa à Ilha!
Tal povo, tal chefe...

1 comentário:

Anónimo disse...

so' um conselho, se quer falar de um blog leia-o correctamente, se nao entender pergunte, creio mesmo que nao entende absolutamente nada mas disponha que nos explicaremos.
ja' agora, para sua informacao devo dizer-lhe que esta' redondamente enganado a quem comenta ou escreve no blog a que se refere.