quinta-feira, 17 de abril de 2008

Panem et Circenses

Ontem fui ao Circo Alvalade XXI ver o meu Sporting bater copiosamente (e com todo o mérito) o Benfica por 5-3 num jogo épico que vem mais uma vez provar que o futebol é de facto uma metáfora da vida. Mostra também que estas duas equipas feridas no seu orgulho, podem ir buscar energias a desconhecidas profundidades e que é precisamente isso, não meramente o facto de ter milhões de adeptos, ou mais títulos que as torna "Grandes".
Só é pena os energúmenos que gravitam em torno das duas equipas (e de outras, também). Foram comigo ao jogo dois primos meus do Benfica, o N. e a J. e, como é óbvio, levaram os seus cachecóis. Embora não tivessem tido problemas no estádio propriamente dito, na ida e sobretudo à vinda, foram brindados com insultos, atitudes ameaçadoras, chegando mesmo um idiota mais exaltado a tentar roubar o cachecol ao meu primo N. Calhou não ter havido problemas como aconteceu comigo quando fui esta época à Luz (roubaram-me o cachecol e se não fugisse ainda levava um murro). Infelizmente, neste país, quando se vai a um estádio, a Constituição é temporariamente suspensa e entra-se numa selvajaria medieval de "nós" contra "eles". Não há direito a opiniões contrárias ou mesmo ao simples direito a ser deixado em paz.
Na Roma antiga, pelo que sei, era a mesma coisa. No Circo Maximus quando os adeptos das equipas verdes, azuis, vermelhas ou brancas se encontravam havia sempre cenas de pancadaria e até mortos. Os adeptos de cada uma juntavam-se em partes diferentes do Circo e aí permaneciam se não queriam problemas ou, querendo problemas, iam à cata de membros isolados dos rivais nas imediações.
Quando, há alguns meses atrás, deixei o Circo da Luz, já sem o meu cachecol, prometi a mim próprio que nunca mais iria voltar a ver ao vivo um Benfica-Sporting, acompanhado ou não. Como quebrei a jura, senti de forma particularmente forte a agitação que se viveu após o jogo, sobretudo quando ela se virou contra pessoas de quem gosto particularmente. Desta vez prometo não voltar MESMO. Fica feita a jura pública.

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Temo - e temo a sério - que esta gentalha volte a ser usada, como já foi no passado, como tropa de choque para algo de mais sério que clubes de futebol e respectivos dirigentes. Há por ali muita frustação a borbulhar, muita falta de carácter e uma enorme ignorância do mundo.
Aliás, vêm aí, tempos propícios a caos social e a violência organizada. Só falta dar-lhes chefes a valer. Aliás, na Roma antiga, os chefes das facções políticas usavam com agrado os líderes das claques das equipas do Circo Máximo para os seus conspirativos propósitos.
Suspeito que a história se possa repetir se entretanto ninguém, na Republica das Bananas que é este país, tiver mão nestas SA que são as claques. Organizadas ou não.
O problema é que talvez só seja possível semelhante feito se o Circo, afinal o pretexto da sua existência, for por sua vez civilizado. E quem é que vai ter coragem para o fazer, sobretudo quando se aproximam tempos difíceis em que este vai ser cada vez mais necessário para manter o povo entretido?
Pressinto uma serpente a ser chocada no ovo dos estádios de futebol.

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